terça-feira, 22 de setembro de 2009

Noite de Sábado

Noite de sábado, viro à direita na rua escura e procuro o número anotado durante a reunião de pauta no guardanapo do bar de esquina. Paro em frente ao portão preto, olho no retrovisor e vejo dois carros parados atrás de mim. Ufa, elas vieram! Sábia decisão essa de fazer a matéria no mesmo dia que me foi solicitada pela editoria. Movidas pela sensibilidade etílica, as meninas decidiram me acompanhar. Ainda no bar, pensei em me disfarçar de outra pessoa e troquei de roupa com a manu, pro caso de encontrar algum conhecido.

Olhando o lugar começo a achar que o vestidinho xadrez com meia preta da Manu é muito ‘cult’ pra uma casa de swing, chama muita atenção.

Pânico: como num filme antigo, começo a imaginar projetadas fotografias 3x4 de todos os amigos do meu pai. E se tiver um conhecido aí? A voz da editora chefe ecoa na minha cabeça: - como se eles estivessem na missa e você na zona! Todo mundo lá ta no mesmo barco! Coloco a franja recém-cortada na frente do rosto e vou em frente.

Faço como o combinado: jogo luz alta no portão, que se abre em alguns segundos. O estacionamento lotado revela que na cidade existem muitos apreciadores dessa, vamos dizer, prática. Enquanto a ansiedade aumenta corro o olhar pelos carros pra ver se não encontro nenhum conhecido. Logo na entrada, a primeira surpresa: esperava algo parecido com um hall de motel chique, mas encontrei uma recepção de boate. Percebendo o atordoamento a atendente me pergunta:

- é a primeira vez? Sem saber o que dizer e olhando pras caras pasmas das minhas 5 acompanhantes respondo:

- sim, viemos pra uma despedida de solteira.

- Que Legal, quem vai casar?

Pior que mentir é inventar na hora. Olhando a manu com o meu jeans e blusinha aponto pra ela e digo:

- casa-se na semana que vem!

Ela parabeniza a noiva e nos acompanha até uma mesa para as 6 mulheres da despedida de solteira.

Feito isso, começamos um tour pelo local, antes que o ‘show’ começasse. A pista de dança é cercada por portas que levam a ambientes-cenário para a prática sexual. Ainda vazios, pudemos observar com calma cada um deles: pequenas suítes que podem ser chaveadas, cabaninhas feitas com um tecido preto que pode ser aberto a qualquer momento por algum curioso que queira somente assistir, cadeiras do prazer (que até agora não entendi direito como funcionam), ‘casinhas’ individuais com buraquinhos na parede para fazer o que a imaginação mandar com quem não se pode ver e o mais intrigante de todos: o camão, uma cama enorme cercada por sofás e poltronas.

Quando começo a me dar conta das coisas que ainda aconteceriam durante a noite, nossa guia nos convida a voltar à mesa: o show iria começar. No caminho ela faz as últimas recomendações:

- a casa encerra as atividades às 4 da manhã. Nos sábados entram somente casais e mulheres solteiras, sendo assim, contratamos dançarinos para divertir vocês. E por último, mas não menos importante, aqui dentro não é não. Se forem importunadas por alguém é só chamar um dos meninos.

Começa o espetáculo: Alexandre, o bombeiro, entra com um extintor e começa sua performance, por assim dizer. Passa entre as pessoas, toca e é tocado por aquelas e aqueles que desejam. Sai de cena com a mão protegendo o ‘brinquedinho’ tão logo tira sua última peça de roupa. Assumem o posto duas meninas, uma loira e uma morena. Uma de branco e a outra de preto. Dicotomias pra todos os gostos. A apresentação delas demora mais um pouco, levando à loucura muitos dos presentes. Tiram toda a roupa, beijam e são beijadas, tocam e são tocadas por homens e outras mulheres. Os homens vão ao delírio quando vêem as duas se beijando. Escolhem um entre tantos outros, levam ao meio do salão e o atacam com beijos, carinhos e amassos ao som de músicas de gosto muito duvidoso.

Assim que elas saem, entram os dançarinos descalços e de sunguinha. Alguns realmente lindos, fortes e másculos. Pro meu desespero, eles foram avisados da nossa despedida de solteira e vem em nossa direção. Chamam as meninas da ponta mais próxima da mesa pra dançar, mas a Manu recebe ‘atenção especial’ é carregada no colo até a pista por um deles. Ela me olha com cara de vou te matar, mas gosta da brincadeira e aproveita.

Aproveito pra observar as pessoas do local, que tem a luz baixa e não permite o reconhecimento geral de uma só vez. É preciso percorrer cada canto com o olhar pra conseguir identificar características do público, em geral formado por casais de 40 anos em média. Alguns mais novos e outros beeem mais velhos (pra minha surpresa).

Um casal aproveita os lugares vagos e senta-se na nossa mesa. Muito diretamente me perguntam se eu topo um programa com eles. Pasma, digo que não sei, que é minha primeira vez na casa. Começamos a conversar e pra me ‘acalmar’ me revelam que são casados e freqüentam a casa a sete meses. – você vai ver, é bem gostoso, ela me diz e completa: você faria por dinheiro? Conversamos mais um pouco e eu digo que não me sinto a vontade. Eles respeitam, inclusive porque sabem que logo encontram outra pessoa que aceite.

Distraída pelo episódio, nem me dei conta de que o salão esvaziou. Alguns poucos estão com os dançarinos na pista. Crio coragem e volto aos lugares públicos iniciais acompanhada por uma das meninas. O combinado é olhar cada cantinho e detalhe pra depois compartilhar. Sinto falta da minha câmera fotográfica. A luz é tão baixa e o ‘apelo visual’ tamanho que facilmente passaria despercebida.

Tem espaço pra todos os gostos: casais que gostam de ser vistos, pessoas que brincam sozinhas enquanto olham esses casais, pessoas que começam observando e acabam entrando na brincadeira das outras, gente que ‘tenta a sorte’ nas paredes com buraquinhos e gente que compartilha desejos e brincadeiras na cama coletiva. Dentre eles, reconheço o casal de antes.

Do cantinho vazio e escuro, acostumada às horas de laboratório de fotografia, observo sem ser notada tentando não interferir nos acontecimentos. Depois de algum tempo, encontram um outro casal e assim se determina a primeira troca da noite. Os demais abrem espaço e se acomodam nas poltronas e sofás que ficam ao redor, sem serem intimidados ou pararem o que estão fazendo.

De maneira bastante natural, os dois casais começam com carinhos em grupo e logo se dividem em pares. Um com a mulher do outro e vice-versa. O que se segue todos nós conseguimos imaginar. Com uma pitada a mais de emoção e competição, me parece uma tentativa de provar pras mulheres, a sua e a do outro, quem é o melhor. Quando os primeiros terminam, se juntam aos outros e os quatro seguem até o final.

Eu curiosa pra saber como tudo terminava, sou notada. Com a sala cada vez mais cheia, as pessoas foram se aproximando e chegaram ao meu cantinho. Só percebo quando alguém se esbarra. Sentindo mais alguém do lado, sem nem olhar pra onde estava pegando, ele alcança a minha bunda. Levo um susto, chegou a hora de ir embora. Sem pensar muito, me levanto e sigo em direção à porta. Antes de sair, olho os dois casais, que já estão se vestindo. Eles se despedem: beijinhos pras meninas e aperto de mão pros meninos.

Penso comigo: pois é, lavou, ta novo! E saio cantarolando a que pra mim seria a música tema dos acontecimentos da noite: não sou de ninguém, eu sou de todo mundo e todo mundo me quer bem. Já sei onde ir, já sei onde ficar agora só me falta sair. Se bem que marisa monte não combina em nada com a noite. Crio então uma trilha sonora mais adequada, repleta de créus, tchans, calipsos e tudo de mais ‘caliente’ que existe na música pop nacional. Daquelas que pedem pouquíssima roupa e que levaram tantos à loucura no início da noite.

Não, eu não me rendi aos apelos da vontade. Pelo contrário, saí de lá com o coração mais cheio de certeza de que meu amor é de um homem só, embora ainda não o tenha encontrado. E sim, a Manu existe, só não vai se casar nem se chama Manu. Mas é certo que ela gostou! Até a próxima, com mais uma aventura.

la_belle

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